domingo, 26 de fevereiro de 2012

5° Depoimento- Protesto de Portadoras de Endometriose

História da Tathiana Francisco


"Como muitas meninas aguardei minha primeira menstruação com muita ansiedade, pois ela marca na vida da jovem adolescente a passagem da vida infantil para a vida adulta. Ouvia algumas mulheres da família relatar que além do inconveniente de sangrar todos os meses, a menstruação poderia ser acompanhada por cólicas fortes, mas que estas seriam totalmente suportáveis.
O que elas não contavam e nem mesmo eu, é que minhas dores estavam longe de serem suportáveis, desde a minha menarca, pois eu faria parte de um grupo de mulheres portadoras de uma doença silenciosa e muito enigmática – a endometriose.


Nos tempos de colégio muitas foram as vezes em que precisei pedir ao professor de Educação Física que me dispensasse da aula, pois no período menstrual minhas dores abdominais eram muito intensas. Idas ao Pronto Socorro e à especialistas na saúde da mulher só reforçavam a idéia de que eu realmente era muito fraca para as cólicas mensais. Em várias consultas fui informada por médicos que tais cólicas eram normais. Muitos profissionais diante de minhas queixas não solicitavam qualquer exame. Nada era investigado. E a doença foi sendo ignorada.

Ao conversar com amigas percebia que havia algo diferente nas minhas dores, e não encontrava profissionais da saúde para me ouvir. Aplicavam-me medicações na veia para anestesiar minha dor, até que o sangramento cessasse e no mês seguinte o ritual - sangue, dores, pronto-socorro e anestésico para dor - fosse reiniciado.
Com os anos minhas dores foram se tornando mais intensas. Colegas de trabalho já sabiam que num determinado período do mês eu poderia até me ausentar, pois era impossível sair de casa a não ser para buscar auxílio no pronto socorro. E foram muitas as vezes em que me sentia atrapalhando o bom andamento dos atendimentos em prontos socorros, pois alguns profissionais me olhavam com um ar de reprovação, por eu estar ali apenas por uma cólica menstrual. Em alguns meses eu simplesmente me aguentava para não ter que sentir aqueles olhares intimidatórios.



Aos 24 anos, portanto, após 13 anos de sofrimentos mensais, de fortes dores abdominais, vômito e forte sangramento me encaminhei para mais um atendimento em pronto socorro. Um médico me alertou sobre a possibilidade de eu ser portadora de endometriose. Assim, procurei um novo ginecologista (sinceramente nem sei precisar por quantos ginecologistas me consultei alertando que minhas cólicas eram fortíssimas). De posse deste nome ENDOMETRIOSE, segui para mais uma consulta, para um novo profissional, dessa vez por indicação de uma amiga, que ficou extremamente sensibilizada com o meu problema, após presenciar um período de intensa dor em mais um ciclo menstrual.
Este médico disse que seria provável que eu fosse realmente portadora desta doença e solicitou alguns exames. O CA 125 (exame sangue) estava alterado e o Ultrassom mostrava focos da doença.

Me encaminhei para minha primeira videolaparoscopia aos 25 anos. Nesta primeira vídeo a endometriose foi diagnosticada como sendo grau III e após a limpeza dos focos fiz a aplicação do Zoladex para interromper a menstruação, pois descobri que este sangramento era um grande vilão para minha doença. 




Foram muitos anos em que a doença foi ignorada por indivíduos que deveriam ser especializados em investigar a saúde da mulher, assim quando a endometriose se apresentou a mim, já estava em estágio bastante avançado.
Mas ficar sem menstruar pelo menos na minha concepção não era algo natural. E o médico não me alertou adequadamente sobre a minha doença e sobre como a menstruação era prejudicial no meu caso. Pouco consegui encontrar sobre o assunto (pois na época não tínhamos acesso como hoje, há alguns textos por sites na internet) e tamanho foi o meu desespero em ler sobre infertilidade na endometriose que desisti de tentar encontrar respostas para a minha doença. 
Por total ignorância fui levando a vida e menstruando, sem saber que era portadora de uma doença progressiva e incurável.

Em seguida, este médico que realizou minha primeira vídeo. deixou de aceitar meu convênio e assim, me encaminhou para uma colega. Esta ginecologista solicitou os exames de rotina para protocolo de endometriose e me adiantou que eu seria submetida a nova vídeo. Fui submetida a duas videolaparoscopias com esta profissional sem que nenhum foco de endometriose fosse removido do meu útero, dos meus ovários e a situação obviamente somente complicou. Descobri que me submeti a duas cirurgias por esta profissional, sem que nada fosse realizado, pois levei para o médico anterior, as fitas das vídeos realizadas pela médica para que ele verificasse como estava o meu caso, uma vez que sentia muitas dores e não conseguia engravidar.
Fiquei extremamente chocada ao descobrir que fui enganada por esta "profissional" e desenvolvi um medo e uma desconfiança muito grande na medicina.









Mas precisava seguir em frente, pois meu sonho de ser mãe me ajudava a não desistir e me submeti a nova consulta médica com outros profissionais. 



Levei um ano entre novos exames e a preparação para minha última videolaparoscopia. Foi constatada a severidade da minha endometriose grau IV pelo ginecologista e foi solicitado por ele que um gastroenterologista participasse da cirurgia uma vez que havia indícios de que meu intestino havia sido comprometido pela endometriose.
Como não podemos contar com o sistema de saúde pública em nosso país, precisamos pagar por um plano de saúde. Além da limpeza dos focos em meus ovários e útero, foram realizadas a remoção da minha trompa esquerda e uma parte de meu intestino. Fiz novamente a aplicação do Zoladex para interromper minha menstruação e dentro de dois meses conversarei com os médicos que me assistiram na última cirurgia para saber quais são minha reais chances de engravidar.











Se médicos tivessem me orientado e eu conhecesse um pouco mais sobre a endometriose minha atitude em relação a doença teria sido outra. Enfrentaria as consultas médicas de outra forma e minha qualidade de vida certamente seria diferente. Há uma grande probabilidade de que a severidade da minha doença tenha se agravado pelo total descaso da médica ginecologista que me submeteu a duas videolaparoscopias sem que nada fosse realizado durante seu procedimento.

Estamos a todo momento a mercê de médicos despreparados para lidar com a endometriose e quando finalmente encontramos profissionais qualificados para tratarem da doença, somos lançadas a boa vontade dos planos de saúde. Estes não conhecem (ou fingem não conhecer) quais os direitos de seus associados. Não é raro sermos humilhadas quando informamos a necessidade da realização de uma vídeolaparoscopia. Em minha última cirurgia o estresse me acompanhou em todos os momentos em que precisava resolver alguma questão com o convênio médico. Temos a impressão que seus funcionários são treinados para nos desestabilizarem emocionalmente. Solicitamos o que nos é de direito, mas muitas vezes precisamos recorrer a justiça para que possamos fazer valer deste poder legítimo.


A sociedade precisa conhecer esta que tem sido considerada por muitos cientistas, a doença da mulher moderna, com altas taxas de prevalência, pois trata-se de uma doença silenciosa e devastadora tanto do ponto de vista físico como também emocional. A mulher portadora de endometriose necessita de respeito, compreensão e muito apoio.

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Infelizmente isso que aconteceu com a Tathiana ocorre com muitas mulheres ainda. Muitas de nós sofremos com o descaso dos médicos nas emergências, onde vezes consideram a nossa dor como uma simples cólica menstrual, não dando a real atenção e importância. Não é raro termos que implorar por atendimento eficaz nos prontos socorros pois muitos médicos até desconhecem o que é a endometriose.
Bem como ginecologistas, que se dizem especialistas em endometriose, que nos submetem a procedimentos cirúrgicos, algumas vezes sem necessidade, e quando estes são realizados  não fazem de forma correta, podendo levar ao agravamento da doença.
Precisamos ficar atentas a isso! Temos que aprender a questionar, a cobrar por atendimentos bons e de qualidade! É um direito nosso!
A endometriose ainda não tem cura! Porém temos uma grande aliada ao nosso favor que é a informação!


Obrigada Tathiana por compartilhar conosco a sua história!


Caso você também queira dividir conosco uma situação relacionada a endometriose, mande seu depoimento para endometrioseprotesto@gmail.com


Lembrando sempre que juntas somos mais fortes!!!

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